O promotor Osvaldo Barbosa tem 28 anos de
promotoria.
Este ano já atuou em 43 júris.
90% dos acusados que sentaram no
banco dos réus, foram condenados.
Até o final do ano Osvaldo deve completar 70
julgamentos.
No ano passado ele participou de 83
júris.
Um dos homens mais respeitados de Campina Grande conversou com o
renatodiniz.com e falou sobre vários assuntos: Pedregal, maior idade penal, violência
em Campina Grande, vida de promotor, delegados de homicídios, inquéritos, entre
outros.
Confira o que disse o homem que já até pediu
absolvição de réus que ele deveria pedir condenação
PEDIR
ABSOLVIÇÃO? É NORMAL ESSE PEDIDO POR PARTE DO PROMOTOR?
O Tribunal do Júri (nós promotores de
justiça), não está ali para agradar familiares de vítimas. Tudo bem: a gente
sabe da dor dos parentes das vítimas, da aflição, dos momentos difíceis..., mas
o promotor é de justiça e se ele perceber a inculpabilidade do réu (ou réus),
ou então se as provas advindas no processo, forem frágeis demais para você
enfrentar a consciência de um Tribunal do Júri, então ele como promotor de
justiça tem que ter a coragem de pedir absolvição do réu.
ESTE
ANO O SENHOR PEDIU DE UMA SÓ VEZ (NO MESMO JÚRI) A ABSOLVIÇÃO DE TRÊS RÉUS...
Isto mesmo! Foi um caso interessante. Eu
sabia que um deles era culpado, mas eram três acusados. No entanto eu não tinha
como mostrar ao corpo de jurados quem daqueles três era o culpado, pois não
havia no processo a identificação do culpado. Então preferi pedir aos jurados a
absolvição dos três, ao invés de pedir a
condenação dos três. Certamente que dois inocentes pagariam pelo crime que só
um cometeu.
ISSO
NÃO É UMA INCOERÊNCIA?
Veja bem: se você não tem como provar ou
indicar ao corpo de jurados, quem dentre àqueles três atirou na vítima, é
preferível que os três sejam absolvidos, pois você estaria condenando dois
inocentes. É preferível ver os três inocentados.
O
SENHOR COSTUMA COLOCAR NAS REDES SOCIAIS, QUANDO TERMINA UM JULGAMENTO, O TERMO
“GANHOU A SOCIEDADE”. ISTO NÃO É INOPORTUNO? NÃO DEMONSTRA UMA PROVOCAÇÃO?
Veja bem: se bem observar eu não digo se
o réu foi condenado ou absolvido. Um advogado (no início) indagou: como é que
pode? E a sociedade só ganha quando o réu é condenado? E eu respondi: “Você
leia novamente. Eu não expressei que ganhou a sociedade por causa da condenação
do réu. Se você vir outras postagens minhas, verá que tem casos em que eu
coloco que ganhou a sociedade, pois o réu foi absolvido a pedido do ministério
público”.
A
IMPRENSA É FUNDAMENTAL NUM JULGAMENTO?
O papel da imprensa é fundamental.
Participei recentemente de um evento promovido por uma faculdade particular, cujo
tema era “O PAPEL DA MÍDIA NO TRIBUNAL DO JÚRI”. É bem verdade que quando o
corpo de jurados se depara com uma plateia imensa (por exemplo: pessoas com
camisas onde estampam fotos da vítima; aquilo tem certa influência), existe
certa influência; com uma imprensa que veicula a importância de determinado
júri, existe certa influência. Entretanto se no processo não houver provas
firmes e cabais para se pedir uma condenação, a mídia não terá influência
alguma. E digo mais: o corpo de jurados de Campina Grande é um corpo de jurados
dos mais conscientes. Em se tratando do corpo de jurados de Campina Grande,
ninguém engana. Não tem como enganar. Não são palavras bonitas ou o fascínio
que o promotor possa passar, para este corpo de jurados, que vai decidir pela
absolvição ou condenação do réu. Quem indica e quem dar o caminho, quem norteia
o corpo de jurados, é o processo.
OS
ADVOGADOS CRIMINALISTAS EM CAMPINA GRANDE: ALGUMA OBSERVAÇÃO?
Nós temos grandes bancas de advocacia em
Campina Grande. Eu prefiro não citar nomes. Seria cometer injustiça. Campina é
um celeiro de grandes criminalistas. Eu tenho enfrentado uma situação naquele
tribunal que é preciso que eu faça um esforço hercúleo para se contrapor à defesa.
É preciso estar preparado, mas eu tenho uma crítica a fazer: é que muitos
advogados que não são criminalistas abraçam uma causa (para defender um réu) e
quando chega às vésperas do julgamento, abandonam a causa. Isto foi motivo até
de uma comunicação minha a OAB/Campina
Grande, para que fossem chamados esses profissionais, pois não é justo. São
muitas vezes profissionais da área cível. Veja bem: ele não quer perder aquele
cliente, aquele pagamento e abraça a causa. É importante dizer que processo do
Tribunal do Júri, afeito ao Tribunal do Júri, se prepara na instrução para o plenário do júri. Então se advogado
não se esforça, não tem o cacoete dos grandes criminalistas e abandona a causa
quando processo estar prestes a ir a julgamento, trás um prejuízo enorme para o
acusado. Isto é visto a olhos nus.
MAS
ESTA OBSERVAÇÃO NÃO SE CONTRAPÕE A FUNÇÃO DO SENHOR COMO PROMOTOR?
Veja bem: eu fiz um júri, tempos atrás,
em que o réu me disse: “Dr. Eu não
aguento mais, eu não tenho mais dinheiro para pagar advogado.” Eu fui olhar
no processo e já havia passado quatro advogados na causa do réu. Isso é
terrível. Eu repito: o promotor é um promotor de justiça. Ele não está ali para
promover vingança. Ele está ali para fazer justiça. No momento que ele observa,
dentro do processo, a inculpabilidade do réu (seja por falta de provas ou
provas frágeis), o promotor tem obrigação e coragem de pedir a absolvição do
réu.
SOBRE
A DIVISÃO DE HOMICÍDIOS EM CAMPINA GRANDE, QUE ABRIGA QUATRO DELEGADOS. A QUALIDADE
DOS PROCESSOS AJUDA AO MINISTÉRIO PÚBLICO, À PROMOTORIA? COMO É O
RELACIONAMENTO?
Certa vez me fizeram esta pergunta, na antiga
Central de Polícia, e eu critiquei a qualidade dos inquéritos que chegavam ao
Ministério Público e fui mal compreendido. Até fiz uma comparação na época em
que fui promotor por 12 anos de uma promotoria privativa de drogas em Campina
Grande onde eu falava da qualidade dos inquéritos da polícia federal; e parece
que só colocaram “no ar” um trechinho que me complicava perante os delegados da
polícia civil, mas depois foi sanado. No entanto é preciso dizer que muitos
inquéritos de então eram de péssima qualidade, não tinham conteúdo e não havia
consistência. A preço de hoje eu posso dizer que temos delegados espetaculares,
e eu cito Antônio, Maíra, Assis e Tatiana (que são os delegados que me municiam
nos processos que vão ao tribunal do Júri). Abro aqui um parêntese para mencionar
a delegada Cassandra (que está em João Pessoa). Quanto aos processos assinados
por esses delegados, são processos riquíssimos em subsídios. Eu posso ofertar
uma denúncia sem pestanejar, mas se chega um processo vago, sem conteúdo, eu
terei dificuldade para ofertar a denúncia. Muitas vezes se um processo volta à
delegacia, é por necessidade. No entanto hoje eu lhe digo com toda sinceridade:
os delegados da Delegacia de Homicídios em Campina Grande têm tido o cuidado de
angariar provas contundentes nos processos. Vou citar um exemplo: a delegada
Tatiana esteve à frente de um caso de repercussão nacional e conduziu um
inquérito de maneira irretocável. Foi um espetáculo. Ela confeccionou um
inquérito de forma tal que os acusados estão e ficaram amarrados no inquérito.
Isto proporcionou uma denúncia feita por mim (Ministério Público) que não tem
como argumentar que aqueles acusados são inocentes.
NA
ÓTICA DE MUITOS, O PROMOTOR É QUASE UM CARRASCO. PARTINDO DAÍ, EU PENSO QUE
QUEM EXERCE ESTA PROFISSÃO TEM QUE TOMAR ALGUNS CUIDADOS. O SENHOR É UM HOMEM
CASADO, TEM FILHOS, TEM UMA VIDA FORA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. COMO É O “OSVALDO”
FORA DO TRABALHO?
Eu tenho uma vida muito regrada, mas é algo
de mim. Eu sou assim. Eu sou caseiro, vivo muito em casa, estudo em casa. De
vez em quando eu saio com a família, pois é uma necessidade comum. A minha luta
é muito grande. Você me acompanha e sabe. Se fosse só o Tribunal do Júri, tudo
bem, mas tenho outras atividades. Sou
coordenador das promotorias criminais de Campina Grande, sou o gestor da 10ª
Área Integrada de Segurança Pública (que abrange Campina Grande, Lagoa Seca,
Massaranduba e Boa Vista), sou gestor da 2ªREISP (que abrange 110 municípios) e
ainda tem a ENASP em Brasília. Todas essas funções tomam tempo, mas tenho quer
ter o cuidado de ter um tempinho para a família. Para se ter uma ideia, recentemente
terminei um júri em Campina Grande varando a madrugada e às 06h00 deste mesmo
dia já estava viajando para Monteiro, no Cariri, para atuar em um júri e este júri
terminou meia-noite. Eu faço muitos júris para colegas promotores que por
motivos de doença não podem atuar. É por isso que eu disse que atuei em mais de
80 júris. Sendo assim sou muito caseiro (é tanto que ainda não fui ao Momento
Junino).
MAIOR
IDADE PENAL: QUAL A OPINIÃO DO SENHOR? EXISTE UM GRANDE EQUÍVOCO SOBRE ISTO?
Este é um assunto muito melindroso.
Deveria ser debatido mais à miúde. Não se pode dizer: vamos diminuir para 16
anos. O caminho não é este. Você (Renato) acompanha o dia a dia e sabe que os presídios
estão abarrotados. Se aprovada essa lei, vai se fazer o quê com esses adolescentes
de 16 anos? Colocar onde? Eu entendo (essa é minha opinião), que cada caso é um
caso. Deveria ser o seguinte: dependendo do crime que esse adolescente venha a
cometer, a justiça teria por obrigação analisar com bastante cuidado o caso.
Agora se fosse um reincidente, teria que ser ver com outros olhos, mas eu não
concordo em pegar os nossos adolescentes e jogá-los. É preciso cautela. A
pergunta é: o que estamos fazendo com os nossos adolescentes? O que nós queremos
para os nossos adolescentes? Cadê a educação? Quem são esses adolescentes? Quem
são os pais? Noutro dia, eu falava com um promotor e perguntava sobre os pais
desses meninos que ficam nas ruas de Campina e ele me disse: na maioria dos
casos, os pais estão presos, as mães estão drogadas, os pais são alcóolatras. Vou
lhe dizer uma coisa: a maioria dos réus é jovem. Nos júris que atuei a maioria
é jovem. Na última semana de maio atuei num caso onde o réu tinha 25 anos. E sabe
quantos homicídios ele tem “nas costas”? Cinco homicídios!
Então eu lhe respondo com toda
sinceridade: Essa questão de maioridade penal é para ser estudada mais à miúde.
Tudo isso é muito complicado.
SITUAÇÕES
RECENTES DE VIOLÊNCIA NO BAIRRO PEDREGAL, NO PRESÍDIO DO SERROTÃO, NA CIDADE DE
CAMPINA GRANDE (COMO UM TODO). COMO O SENHOR VIU ESTES CASOS?
Onde já se viu ônibus queimados em
Campina Grande? A gente nunca tinha visto falar disso. Teve aquela morte (de
Henrique) no Serrotão. Henrique, inclusive, era cliente nosso nos dois tribunais
do júri (1º e 2º). Vinte dias atrás ele veio do PB1 para uma audiência e eu perguntei:
“menino” Henrique, quantas pessoas tu já matasse? E ele respondeu: “Doutor, eu já matei umas dez pessoas, mas
agora estou evangélico, não quero mais me meter nisso, quero pagar pelos meus
crimes, sou novo ainda, sou jovem. Lá no PB1, doutor, ficam membros do pcc, al
kaida e estados unidos tudo querendo me contratar, mas eu digo: me deixem
quieto. Mas eu quero lhe fazer um pedido doutor: Deixa eu voltar para Campina
Grande, pois minha família é daqui”...Então eu disse: Fique por lá, mas ele
conseguiu através da Vara das Execuções, voltar para Campina Grande e aconteceu
aquilo. A partir daquela morte se desencadeou aquela situação que Campina Grande
vivenciou. Isso serve para nós observarmos a força que “esse pessoal” tem de dentro
do presídio. Sobre o Pedregal eu lhe
digo: identifico-me com o bairro, mas outros bairros têm problemas tanto quanto
o Pedregal e exemplifico: O Glória, Jardim Continental, Araxá, e outros.
Fizemos uma varredura no Pedregal e passamos alguns meses sem ocorrências no
bairro. Depois toda a situação se descontrolou. Até toque de recolher foi
anunciado (na mídia). Eu me preocupei, eu não aceitava aquilo. Tanto é que me
reuni com o major Gilberto (comandante do 2ºBPM) para saber por qual motivo o
bairro, com uma UPS (Unidade de Polícia Solidária), deixasse isso acontecer. Para
que está serviço essa Unidade de polícia Solidária? O que está acontecendo?
Onde estamos errando? Como devemos concertar? Por causa disso, o ministério
público vai se reunir com major Gilberto, coronel João da Mata (comandante do
CPR1) e outras autoridades para a gente estudar uma maneira de livrar o bairro
dessa situação, pois não estar dando certo.
EXPLIQUE-ME:
O QUE É ACORDADO NO GABINETE, NÃO VAI PARA A PRÁTICA, NA RUA?
E verdade! A gente trabalha. Enquanto as
pessoas pensam que nós estamos parados, nós estamos trabalhando. Estamos nos
reunindo para por em prática o que acordamos. Mas o que acordamos no gabinete
tem que ser posto em prática.
A
FUNÇÃO QUE O SENHOR EXERCE É ÁRDUA E A MEU VER, PERIGOSA E DE RISCO? O SENHOR
JÁ FOI AMEAÇADO?
Se eu dissesse a você que já fui ameaçado
várias vezes, eu estaria mentindo. Eu nunca fui ameaçado e olhe que eu sou
promotor há 28 anos. Eu tenho e tomo os meus cuidados, pois não sou bobo. A
pessoa que mais se expõe para um acusado no Tribunal do Júri é o promotor. Não
é o magistrado, não é o advogado (a defesa é dele). Mas eu sempre mantive e
manterei o respeito ao réu, seja ele quem for. Eu nunca me indispus. Cuidado em
sempre tive, pois tenho família e um promotor, pela função, de se policiar.
DEUS tem me guardado e tem me protegido sempre.
O
SENHOR PRETENDE ENCERRAR SUA CARREIRA NO TRIBUNAL DO JÚRI, OU PRETENDENTE UMA
PROMOTORIA, DIGAMOS, MAIS “LEVE”?
Eu ainda tenho uns anos pela frente. A
gente começa a ficar sabendo que está ficando velho, quando alguém faz esta
pergunta. Ou seja: “Dr. Osvaldo, o senhor
está perto de se aposentar?” Ai o camarada começa a perceber que está
ficando velho. E tem outras perguntas mais contundentes, tipo: “o senhor já se aposentou?”. Mas eu lhe
digo: tenho muito tempo pela frente. E enquanto vida, saúde eu tiver, vou
continuar exercendo essa função que amo e lutando por esta sociedade sofrida
que precisa de defesa.
MAS
O SENHOR NÃO GOSTARIA DE EXERCER A PROMOTORIA FORA DO JÚRI?
Eu fui convidado para assumir a
curadoria do consumidor em Campina Grande, mas a pedidos, eu vou permanecer no Tribunal
do Júri. “Eu não fico feliz quando eu
vejo um jovem sentado no banco dos réus. Isso não me satisfaz. Faz-me feliz um
jovem na escola, no lar com a família. Mesmo quando eu peço a condenação de um
jovem, eu não me satisfaço, não me regozijo. Cumpro minha função. Pode acreditar”.
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