*Cidade tem apenas uma candidata
concorrendo à prefeitura.
*Além disso, só há nove candidatos para
as nove cadeiras na Câmara.
Fred Carvalho
Do G1 RN
“Se nenhum candidato morrer até o dia da
votação, todos seremos eleitos.”
A afirmação é do atual presidente da
Câmara Municipal de Lucrécia, Hélio Maia (PR), que, caso realmente não morra
até 2 de outubro próximo, será eleito para o seu sétimo mandato de vereador na
cidade, que fica a 346 km de Natal.
A certeza da eleição de Hélio Maia se dá
porque Lucrécia é a única cidade brasileira que neste ano não terá “disputa”
para as cadeiras na Câmara: são nove candidatos para as nove vagas existentes.
Além disso, a cidade é uma das 97 do
Brasil que têm um único candidato a prefeito na eleição deste ano.
Lucrécia tem quase 4 mil habitantes, dos
quais 3.265 são eleitores.
Os moradores contam com orgulho que em
1933 o presidente Getúlio Vargas pernoitou na cidade uma vez.
A casa onde Vargas dormiu já não existe
mais.
O presidente foi ao local para visitar a
obra de construção da barragem, que acabou se tornando o único "ponto
turístico" da cidade.
Devido à estiagem que assola o Nordeste
brasileiro há cinco anos, a barragem está completamente seca.
Lucrécia virou município, por decreto,
em 1963.
Os políticos de Lucrécia admitem que
houve um "entendimento" para que houvesse uma candidatura única para
a eleição majoritária.
"Já vínhamos tentando isso há
alguns anos. Lucrécia tem situação e oposição fortes e as disputas eleitorais
são acirradas. Desta vez, durante mais de um ano, tivemos inúmeras reuniões com
a oposição e decidimos que, pelo bem de nossa cidade, teríamos uma chapa única
para a eleição majoritária", afirma o atual prefeito, Walter Araújo
(PSB), que vai deixar a prefeitura após oito anos de mandato.
A candidata da chapa única é a
professora Conceição Duarte (DEM).
Para ele, o fato de ter feito uma gestão
bem avaliada pela população possibilitou esse "acordo".
"Todos demos um passo atrás. Nossa
cidade, como todas as outras pequenas do país, passam por uma crise financeira
histórica. Temos muitas dificuldades até mesmo para pagar a folha salarial e
manter os serviços básicos em pleno funcionamento. Esse entendimento foi a
melhor coisa que todos poderíamos fazer pelo nosso município", diz Araújo.
Mas o "entendimento" foi
apenas para a eleição de prefeito.
Não houve discussões nesse sentido para
a eleição proporcional, a de vereadores.
"Todos os dez partidos que têm
representatividade aqui em Lucrécia tiveram suas convenções normalmente, com
edital de convocação e anúncio na rádio da cidade. Acontece que, por mais
incrível que possa parecer, apenas nove pessoas quiseram se candidatar neste
ano",
afirma Manoel Hélio.
Dos nove vereadores de Lucrécia, seis
serão reeleitos.
O empresário Edson Soares (DEM) já foi
vereador por dois mandatos e – caso tudo corra bem – será eleito para voltar à
Câmara Municipal.
Ele tem uma irmã vereadora e vai
substituir a filha na Casa. "Minha filha tem 22 anos, é engenheira
civil, e decidiu que não quer mais saber de política. Vai se especializar e
tomar conta da nossa empresa", conta.
Para Edson Soares, o principal fator
para que apenas nove pessoas decidissem se candidatar é a descrença com os
políticos e com a política brasileira.
"Em um primeiro momento, qualquer
um pode imaginar que se trata de coronelismo, que isso se deu de forma
impositiva. Mas, na verdade, o que aconteceu aqui é triste. Por todos esses
escândalos que acompanhamos no país atualmente, as pessoas, principalmente os
jovens, passaram a ser descrentes com a política. Confesso que, por muitas
vezes, eu mesmo sinto vergonha de dizer que sou político."
O salário bruto de um vereador em
Lucrécia é de R$ 2,8 mil.
"Eu sou empresário da construção
civil, é de onde sustento minha família. Sou vereador apenas para ajudar a
minha cidade, a minha terra. Já conversei com os demais candidatos e propus a
eles que a próxima legislatura seja voltada para os jovens, para resgatar neles
a vontade de se fazer política", diz Manoel Hélio.
Lucrécia fica na comarca de Almino
Afonso, uma cidade vizinha. O promotor de Justiça Baltazar Patrício diz não ver
irregularidade no fato de haver apenas nove candidaturas para a Câmara de
Lucrécia.
"É
uma situação pitoresca e única. Até o momento, não enxerguei ilegalidade
alguma."
O juiz da comarca, Romero Piccoli, diz
que até o momento não chegou ao Poder Judiciário nenhuma impugnação relativa ao
registro dessas nove candidaturas.
"Ainda haverá análise final sobre o
deferimento ou indeferimento desses registros."
A população de Lucrécia aprova as
candidaturas únicas. A professora Rosali Costa elogia o fato de não haver
gastos exagerados com as campanhas.
"Essa campanha está tranquila, sem
conflitos. Todas as pessoas do município quiseram um candidato só. Eu acho que
Lucrécia só faz ganhar com isso."
Para o funcionário público José Grimaci,
a tranquilidade tem sido a tônica dessa campanha.
"Antigamente era muito barulho,
muitos fogos. Agora está diferente. Estamos tendo paz."
De acordo com a minirreforma eleitoral
de 2015, cada candidato a vereador tem que atingir o quociente eleitoral.
Para fazer esse cálculo, é preciso levar
em consideração o número de votos válidos, que é o total de votos menos os
brancos e nulos, e dividir pelo número de cadeiras que serão ocupadas.
Quando um dos candidatos não atinge esse
quociente, é preciso fazer um novo cálculo devido à sobra de vaga.
Na cidade, essa conta não importa.
Para ser eleito basta que o candidato
obtenha pelo menos um voto.
"Pela Lei, nesse caso de Lucrécia,
para ser eleito basta que o candidato obtenha pelo menos um voto. As únicas
chances de qualquer um desses nove candidatos não se elegerem são se não
votarem nem mesmo em si próprios ou realmente morrerem antes da eleição", explica o juiz
e professor de direito eleitoral José Herval Sampaio Júnior.
Herval afirma ainda sobre a
possibilidade de falecimento de um dos candidatos a vereador após a eleição.
"Caso algum deles morra ou mesmo
renuncie ao mandato, o que é um direito, a Câmara Municipal de Lucrécia será a
única do país com menos de nove vereadores. Isso porque, como não há outros
candidatos fora esses, também não haverá suplentes. Para evitar essa situação,
a Câmara poderá solicitar eleições suplementares para o Legislativo. Mas essa
decisão caberá à Justiça Eleitoral."
Mesmo com a "disputa"
eleitoral praticamente ganha por todos os candidatos a vereador, há campanha
nas ruas de Lucrécia.
Carros de som percorrem as zonas urbana
e rural e os candidatos promovem "adesivaços" para reforçar os
números das candidaturas junto aos eleitores.
"A campanha corpo a corpo é boa
para conquistar votos. Além disso, essas caminhadas fazem bem à saúde, o que
ajuda a me manter vivo até a eleição", brinca Hélio
Maia.
A disputa para prefeito também está
definida.
Lucrécia tem apenas uma candidata nessas
eleições: a professora Conceição Duarte.
Na convenção, 8 dos 10 partidos com
representatividade na cidade formaram a coligação Unidos por Lucrécia (DEM,
PSD, PSDB, PR, PP, PTN, PMDB e SD).
"Embora seja a única candidata,
faço a campanha como se houvesse uma disputa real. Isso porque, para mim, eu
estou numa disputa, sim. Eu não posso passar a vergonha de 'perder' para os
votos em branco", diz Ceiça.
O salário bruto do prefeito está em R$ 9
mil.
Conceição registrou as propostas de
governo.
Nelas, ela diz que pretende "dar
continuidade às melhorias das condições de vida dos lucrecienses, buscando com
firmeza, criatividade e objetividade, aperfeiçoar programas que já têm
demonstrado sucesso".
No documento, Ceiça Duarte afirma que
terá o mandato voltado para a qualidade de vida, criação de oportunidades
econômicas e inclusão social, educacional e acesso à saúde, além do combate à
seca.
Até o início da semana, Conceição nem
era a candidata a prefeita. A mudança se deu porque, em agosto passado, o
Ministério Público ingressou com o pedido de impugnação da candidatura de
Francisco Duarte Filho, cunhado dela, baseado na Lei da Ficha Limpa.
"Isso devido a um julgamento do
Tribunal de Contas do Estado referente a 1997-1999, em virtude de um aumento
ilegal de subsídio de vereadores", explica o promotor Baltazar
Patrício. Nesse período, Chico Duarte presidiu a Câmara Municipal de Lucrécia.
O juiz Romero Piccoli decidiu que a
candidatura de Chico é ilegal. Com isso, a coligação o substituiu por Ceiça.
(G1 RN)
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