Ministério Público Federal (MPF) ajuizou
uma ação civil pública, com pedido de liminar, para que a substância fosfoetanolamina sintética,
popularmente conhecida como a "pílula
do câncer", seja reconhecida como suplemento alimentar.
Também solicita que sua produção,
comercialização ou mesmo importação sejam liberadas em todo o território
nacional.
A ação foi ajuizada em Uberlândia (MG).
A fosfoetanolamina sintética começou a
ser estudada no Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da Universidade de
São Paulo (USP), pelo pesquisador Gilberto Chierice, hoje aposentado.
Apesar de
não terem sido testadas cientificamente em seres humanos, as cápsulas eram
entregues de graça a pacientes com câncer por mais de 20 anos.
A substância, conhecida pela ciência
desde 1939, é produzida naturalmente pelo corpo humano e está presente no leite
materno.
A 3ª Vara Federal de Uberlândia recebeu a liminar e intimou o
Município de Uberlândia, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a
União Federal e o Estado de Minas Gerais para pronunciem sobre a ação.
Na liminar, o procurador da República,
Cléber Eustáquio Neves, solicita judicialmente que:
*a
União e a Anvisa sejam impedidas de criar obstáculos ao registro, à produção, à
distribuição e à comercialização da substância, abstendo-se, inclusive, de
aplicar qualquer tipo de sanção.
*a
Anvisa seja obrigada a promover a regulamentação da Lei nº 13.269/2016, dentro
do prazo de 30 dias, devendo publicar ato normativo reconhecendo a
fosfoetanolamina como suplemento alimentar, autorizando-se a sua produção,
comercialização, distribuição e aquisição em todo território nacional.
*a
União, a Anvisa, o Estado de Minas Gerais e o município de Uberlândia adotem
todas as medidas administrativas necessárias para que, no prazo de 90 dias, a
substância Fosfoetanolamina sintética seja disponibilizada no Sistema Único de
Saúde (SUS) para todos os pacientes que tenham indicação de recebê-la.
Em nota, a União, por meio da
Advocacia-Geral da União (AGU), informou ao G1 que apresentou manifestação no
processo que, "em síntese, defende que a Anvisa não está proibindo empresas de
produzir e comercializar produtos à base de fosfoetanolamina, mas que a
autarquia apenas exige que as mesmas cumpram os trâmites legais para
regularização da substância como alimento, procedimento este que deve ser de
interesse das fabricantes.", explicou no texto.
Já a Anvisa, também por meio da AGU,
disse que irá apresentar manifestação no processo dentro do prazo legal.
A Secretaria de Estado de Saúde de Minas
Gerais (SES-MG) informou a reportagem que encaminhou a demanda para área
responsável e que em breve retornará sobre o assunto.
A Prefeitura de Uberlândia disse que foi
notificada da ação do MPF e vai responder judicialmente dentro do prazo
estipulado.
HISTÓRICO
O químico Gilberto Orivaldo Chierice,
professor aposentado do IQSC, começou a estudar a substância na década de 1980
e passou a trabalhar com a hipótese de que ela teria uma ação anticancerígena.
Ele desenvolveu, então, um método
próprio para sintetizar a substância em laboratório.
O processo para se testar a segurança e
as possíveis propriedades terapêuticas de um componente é longo e envolve
várias etapas de pesquisa.
O lançamento da fosfoetanolamina como
suplemento já tinha sido sugerido pelo então ministro da Ciência, Tecnologia e
Inovação, Celso Pansera, em março de 2016.
Em abril do mesmo ano, uma lei
sancionada pela então presidente Dilma Rousseff autorizava a produção e venda
da pílula, mas foram suspensas por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em
maio de 2016.
Em julho de 2016, o Instituto do Câncer
do Estado de São Paulo (Icesp) iniciou um estudo e pacientes passaram por
avaliação por uma equipe especializada com experiência em testes clínicos.
Em 2017, o Icesp suspendeu a pesquisa
devido à ausência de "benefício
clínico significativo" nas pesquisas realizadas.
UTILIZAÇÃO
COMO SUPLEMENTO
A ação civil pública do MPF ajuizada
este ano retomou a polêmica no que diz respeito a utilização da pílula do
câncer.
Segundo o documento, em 2015 o MPF instaurou um inquérito civil cujo
objetivo era apurar a eficácia, a viabilidade e a necessidade de produção em
larga escala do princípio fosfoetanolamina sintética para o tratamento do
câncer.
De acordo com o procurador Cléber
Eustáquio, após uma série de quatro estudos, coordenados pelo Ministério da
Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), ficou demonstrado que a substância é
atóxica e segura, sem apresentar quaisquer efeitos colaterais que pudessem
tirar sua eficácia, ou mesmo efeitos deletérios ou prejudiciais à saúde de quem
dela fizesse uso.
"Apesar de ser tratada
popularmente como uma substância destinada a pacientes com câncer, a verdade é
que a fosfoetanolamina nada mais é do que um suplemento alimentar ou apenas
alimento, pelos parâmetros da Anvisa", disse o procurador na ação.
Ainda segundo o MPF, a substância que é
conhecida pela ciência desde 1939 e produzida naturalmente pelo corpo humano e
presente no leite materno é, portanto, necessária ao bom funcionamento celular.
No ano passado, pesquisadores que
participaram dos estudos sobre a pílula do câncer informaram a venda da
fosfoetanolamina como suplemento alimentar em produto anunciado no site de uma
empresa registrada nos Estados Unidos.
"Sua ingestão diária auxilia no
reparo celular e equilibra as funções orgânicas e metabólicas do corpo, sendo
bastante útil como alimento para idosos e/ou alimento para atletas. Nos EUA e
em vários países da Europa a substância já é bastante conhecida e
comercializada livremente", explicou Cléber Eustáquio.
REGULAMENTAÇÃO
O MPF entende que a substância pode ser
livremente produzida e comercializada em todo o território nacional, desde que
os regulamentos técnicos que regram a produção e garantam a qualidade do
produto sejam seguidos, como determina o Decreto-Lei 986/1969 e a resolução RDC
nº 27/2010 da Anvisa, que determina que o produto seja indicado exclusivamente
como um alimento, sendo vedadas indicações terapêuticas ou medicinais.
"Infelizmente, existe um
entendimento equivocado de que a fosfoetanolamina seria um medicamento, o que,
com certeza, não o é. Trata-se de suplemento alimentar com funções de melhoria
no estado geral de saúde dos seres humanos e ainda produzida naturalmente pelo
organismo e que, portanto, não precisa de autorização da Anvisa para ser
produzido e comercializado", finalizou o procurador Cléber
Eustáquio.
O G1 consultou o andamento processual
sobre o pedido do MPF em relação à fosfoetanolamina sintética nesta
quarta-feira (13/06), no entanto ainda não foi informado se as partes citadas já
manifestaram sobre o caso.
(Por Bárbara Almeida, G1 Triângulo
Mineiro)
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