Morreu aos 72 anos, a sambista Beth
Carvalho.
Ela estava internada no Rio de Janeiro.
Grande intérprete, Beth Carvalho ficou
conhecida carinhosamente como a 'madrinha do samba', pelos talentos que
descobriu e apadrinhou ao longo de sua carreira, como Zeca Pagodinho e o grupo
Fundo de Quintal.
A sambista nasceu Elizabeth Santos Leal
de Carvalho, no Rio, em 1946.
A paixão pela música, ela herdou da
família.
Sua avó tocava bandolim e violão.
Desde criança, ouvia Sílvio Caldas,
Elizeth Cardoso e Aracy de Almeida, que eram grandes amigos de seu pai e que
ele recebia em sua casa.
E ali Beth ouvia, atenta, aos convidados
do pai - e à cantoria.
Na adolescência, cantava bossa nova e
outros ritmos em festas e, para ajudar a família, após o pai ser perseguido na
ditadura por seus pensamentos de esquerda, ela passou a dar aulas de violão.
Não por acaso, herdou do pai a postura engajada por toda a vida.
Gravou o primeiro compacto em 1965, com
a canção 'Por Quem Morreu de Amor', de Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli.
Nos anos seguintes, seguiu a trilha dos
festivais.
Seu primeiro sucesso foi Andança, de
Edmundo Souto, Paulinho Tapajós e Danilo Caymmi, que ela defendeu no Festival
Internacional da Canção, em 1968, e com o qual conseguiu o 3.º lugar.
A música também deu título ao seu
primeiro LP, que foi lançado em 1969.
Emendou outros sucessos na sua voz, como
o hino 'Vou Festejar', e eternizou 'Coisinha do Pai'.
Na década de 1970, foi ao encontro dos
mestres, ao gravar 'Folhas Secas', com Nelson Cavaquinho, e 'As Rosas Não
Falam', de Cartola.
Dois momentos sublimes em sua carreira.
Ficou conhecida também sua presença
assídua na quadra Cacique de Ramos, onde Beth identificava talentos no samba e
os revelava, como aconteceu com nomes como Fundo de Quintal, Zeca Pagodinho,
Almir Guineto, Sombra, Sombrinha, Arlindo Cruz, Jorge Aragão, entre tantos outros.
Daí a alcunha de 'madrinha do samba'.
"Quem levou Beth Carvalho pro
Cacique foi o Alcir Portela, que era jogador naquela época. Ela se apaixonou
pelo samba tocado embaixo da Tamarineira. Gostou tanto que resolveu gravar com
a gente em estúdio, no formato da nossa roda de samba", contou, em
seu site, o cantor, compositor e percussionista Bira Presidente, integrante do
Fundo de Quinta.
Beth Carvalho não renegava o posto de
madrinha, da grande matriarca, mas preferia não ter essa função.
Gostaria que os talentos tivessem outros
tipos de incentivo e oportunidades para se expor.
"Não é meu papel, mas sou assim,
gosto de mostrar o que há de bom", disse, certa vez, em entrevista
ao Estado.
Mangueirense de coração, foi homenageada
por outras escolas de samba: foi tema de enredo da Escola de Samba Unidos do
Cabuçú, 'Beth Carvalho, a enamorada do samba', em 1984, e recebeu da Velha
Guarda da Portela uma placa comemorativa por ela ter sido a cantora que mais
gravou seus compositores.
Em 2009, no Grammy Latino, ganhou o
prêmio Lifetime Achievement Awards, em celebração à sua carreira.
No mesmo ano, precisou fazer uma pausa
por causa de uma fissura na região sacra, que a obrigou a ficar em repouso
total. Voltou aos palcos no dia 19 de fevereiro de 2011, no show de encerramento
do evento Sesc Rio Noites Cariocas.
Poucos meses depois, em abril, a cantora
se apresentou em São Paulo e, na ocasião, disse ao Estado que havia se
surpreendido consigo mesma após passar 1 ano e meio convalescendo em cima de
uma cama.
"Tive paciência de Jó. Contei com
o apoio dos amigos e da família. Toda hora tinha pagode em casa",
contou ela, à época.
Apesar de a cantora se manter na
estrada, suas condições físicas foram piorando.
Em 2018, fez apresentações deitada.
Por causa das dores, não conseguia ficar
sentada.
E emocionou as plateias.
No final do ano passado, foi morar com a
filha, a cantora e compositora Luana Carvalho, fruto de seu relacionamento com
o jogador Édson de Souza Barbosa, mais conhecido como Édson Cegonha.
Ao Estado, na época do lançamento de seu
trabalho de estreia, o disco duplo 'Sul' e 'Branco', em 2017, Luana não negou
que seu maior desafio talvez estivesse relacionado ao fato de ser filha de Beth
Carvalho.
Ter como mãe uma grande intérprete como
ela lhe deu menos direito ao anonimato, tampouco licença para se lançar crua na
carreira musical.
"Para eu aparecer com as minhas
canções, sendo filha de uma pessoa que já tem um trabalho muito conhecido,
talvez o mais delicado seja o quanto você precisa chegar com um senso estético
já muito bem apurado, com uma proposta um pouco mais concreta, mas afinal são
muitas vantagens também", disse Luana.
Beth Carvalho estava internada desde o
dia 8 de janeiro, no Hospital Pró-Cardíaco, em Botafogo, no Rio, onde recebeu
amigos para uma animada roda de samba.
Ela tinha mais de 50 anos de carreira e
uma discografia de 33 discos e 4 DVDs - e muitos prêmios, homenagens e troféus
conquistados ao longo de toda uma vida dedicada ao samba.
(Adriana Del Ré/ Estadão)
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