A
rotina de trabalho do músico cearense Raimundo Fagner parece a de um
garoto de 20 e poucos anos.
Depois de um mês fora de casa,
apresentando shows pelo Brasil, a primeira coisa que ele faz ao
retornar para a terra natal é marcar uma tarde de gravação do novo
disco e atender a equipe do G1 para falar sobre o aniversário de 70
anos.
A nova idade será celebrada neste domingo (13/10), com homenagens
em Fortaleza e Orós (cidade materna da família do cantor, distante
345 km da Capital).
Apesar
da vida agitada, ele tece críticas contundentes ao ramo profissional
que escolheu há mais de quarenta anos.
"O mercado já acabou,
mas a gente está buscando fazer uma música que acredito que possa
ainda tocar as pessoas. As gravadoras não esperam mais, mas o
público espera, então tem que privilegiar ele, que acompanha a
gente há muito tempo", diz.
O
compositor não concorda, porém, com uma afirmação recente do
colega Milton Nascimento, de que "a música brasileira está uma
merda", dita em entrevista ao jornal Folha de São Paulo.
"Eu
jamais daria uma opinião como a do Milton, é tanto que ele se
arrependeu. No mais, acho que cada um faz sua música, faz o seu
tempo. Na época que nós fomos modernos, não tinha que estar
reclamando de nada. É o que está se vivendo, é o que está se
passando e a gente não pode querer transferir épocas. Então,
parabéns a quem estiver fazendo música atual com qualidade, porque
realmente é uma fórmula muito igual. No bolo, sempre tem gente
muito boa", defende.
Nos
anos 1970, quando trocou a faculdade de Administração pela carreira
musical, Fagner tinha uma certeza: "é preciso arriscar o
presente em prol do futuro".
E esse sentimento o acompanha até
hoje.
Atualmente ele trabalha em um repertório de canções inéditas com os parceiros Renato Teixeira, Fausto Nilo, Moacyr Luz e Zeca Baleiro.
Atualmente ele trabalha em um repertório de canções inéditas com os parceiros Renato Teixeira, Fausto Nilo, Moacyr Luz e Zeca Baleiro.
O
novo disco ainda não tem data de lançamento, mas esse processo de
criação é o que vem instigando o compositor.
"Tô super
motivado, isso é fundamental nessa idade, nesses anos todos de
carreira, você estar compondo, vendo, sentindo a motivação das
pessoas que estão ao seu lado trabalhando."
Além
do mercado musical, o cantor afirma que a situação política do
Brasil também o aflige.
"Esse ano a gente tem essa preocupação
de estar existindo uma polarização ideológica muito forte, e que o
país tem que caminhar pelo centro. A gente tem uma expectativa aí
financeira, de nível de esperar do Brasil, que a gente sempre acha
que vai pra frente, mas tá sempre dando um passo atrás, então é a
preocupação de que o país possa sair desse momento difícil
ideologicamente, economicamente. Eu
posso estar bem, mas você tá ali ao lado de alguém que está
sofrendo, as pessoas estão desempregadas, tudo isso afeta a gente", completa.
FAMÍLIA
O
que ajuda a elevar o astral do cearense é a convivência com os
familiares. A presença do filho Bruno e dos netos Clara e Arthur em
seu cotidiano o faz acreditar que este "é o momento mais
incrível que poderia estar vivendo".
"O 'Tuti' tá
aprendendo bateria, a Clarinha com certeza será uma modelo. Tão
lindos, me dão muita alegria, emoção, apesar da correria da vida e
de a gente se ver pouco, porque eles também são muito ocupados, mas
o Bruno tá muito no meu dia a dia", afirma.
A
história do filho foi revelada tardiamente, apenas em 2006, e consta
no capítulo introdutório da biografia do cantor, lançada em abril
pela jornalista Regina Echeverria.
Após a morte dos pais de Fagner,
o libanês Youssef Fares Haddad Lubous e a cearense Francisca
Candido, e também dos irmãos Fares, Eliete e Elizete, a rotina
entre o Rio de Janeiro, cidade dos herdeiros, e Fortaleza, onde vive
a irmã Marta Lopes, é um conforto.
A
saudade é sentimento que ele desconhece.
"Eu tenho uma memória
muito boa. Eu vejo cada coisa como se fosse ontem, lembro de
detalhes, não sinto saudade de nada. Eu vivencio tudo e, para mim,
eu continuo vivenciando tudo. Eu quero tocar a vida, tocar naquilo
que as pessoas ainda esperam da gente", destaca.
Talvez
por isso o cantor não consiga hoje retornar à cidade de Orós, onde
passou a maior parte de suas férias tomando banho de açude, com
tanta facilidade.
Já faz três anos desde a última visita.
"Aquelas
águas muito baixas dão uma tristeza danada. Eu espero que tenha um
bom inverno e que eu possa voltar pra tocar as coisas que a gente vem
fazendo", observa.
PROJETO SOCIAL
Em
Orós está a sede da Fundação Social Raimundo Fagner, que atende
atualmente no Ceará um total de 400 crianças e jovens, na faixa
etária de 7 e 17 anos, regularmente matriculados em escolas
públicas.
O
projeto trabalha na perspectiva da arte-educação, possibilitando
aulas de música, literatura, informática, esportes, entre outras
atividades.
Em Fortaleza, a fundação funciona no Parque Itamaraty,
periferia da Capital, e abriga também uma exposição permanente
sobre a vida e a obra do cantor.
São
estes garotos e garotas que subirão em dois diferentes palcos neste
domingo para homenageá-lo.
Em Orós, um concerto gratuito às 19h,
na Praça Matriz, apresentará as principais canções do cearense;
já em Fortaleza, o espetáculo musical é no Cineteatro São Luiz,
às 18h.
Neste, Fagner fará uma participação especial.
“Vamos
comemorar essa data juntos”, finaliza.
(Por
Roberta Souza, G1 CE)
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