A enfermeira Edmara Silva de Abreu, de 42 anos, morreu na madrugada desta quinta-feira (03/02) em São Paulo após ter sido diagnosticada com uma hepatite fulminante decorrente do consumo de um "chá de emagrecimento".
O produto, vendido em cápsulas, se dizia
"natural" e, na composição, continha ervas como chá verde, carqueja e
mata verde, substâncias hepatotóxicas (que podem causar danos ao fígado).
De acordo com a prima de Edmara, a
professora de educação física Monique de Abreu Saraiva Artecio, de 35 anos, a
enfermeira era "extremamente saudável" e começou a ter sintomas de
enjoo há duas semanas.
"Minha prima sempre foi uma pessoa
extremamente saudável, ela era enfermeira obstetra e sempre estava tudo certo
com a saúde dela. Há duas semanas ela começou a ter ânsia e esse sintoma ficou
mais frequente", disse
Monique ao UOL.
Edmara, que trabalhava no Hospital e
Maternidade Santa Joana, resolveu se consultar com um médico e foi logo
internada porque, na ocasião, a equipe desconfiou que se tratava de um problema
na vesícula.
"Então fizeram exames para saber o que era e
deu que ela já estava com uma hepatite fulminante".
Segundo Monique, os médicos ainda
realizaram mais testes para saber se a doença era decorrente de um agravamento
de leptospirose ou de dengue, que geralmente são os causadores das lesões no
fígado, mas os resultados para ambos os casos deram negativo.
"Então pegaram tudo o que tinha de
medicamento que ela tinha e levaram para os médicos. Foi quando viram esse
frasco de 'Chá 50 ervas emagrecedor' e perceberam o tanto de coisa que tinha
nesse produto".
Segundo a prima, Edmara teria comprado o
medicamento pela internet.
No entanto, a família não sabe desde
quando a enfermeira começou a utilizá-lo.
Edmara foi transferida para a UTI
(Unidade de Terapia Intensiva) do HCFMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo), que é referência em casos de
hepatite.
Ela estava na fila para conseguir um
transplante de fígado, passou por um coma induzido e finalmente conseguiu realizar
a cirurgia, que levou 12 horas, no sábado (29).
No entanto, o corpo da enfermeira
rejeitou o novo órgão e os médicos atestaram a morte cerebral de Edmara na
quarta-feira (02).
Na madrugada do dia seguinte ela sofreu
uma para cardíaca e morreu.
"Ela confiava no medicamento, até
porque ela achou que era natural, está escrito na embalagem que são apenas
ervas. Não é nada de tarja preta, nenhum medicamento que aparenta ser perigoso.
Ela não tava tomando mais nada, só esse mesmo", relata a prima.
"É importante falar disso para que outras
famílias não passem pela dor que estamos passando hoje."
MÉDICA
FAZ ALERTA
A médica assistente no departamento de
gastroenterologia na Divisão de Transplantes de Órgãos do Aparelho Digestivo no
HCFMUSP, Liliana Ducatti, publicou nas redes sociais um alerta a respeito do
uso de substâncias que se dizem naturais, mas que podem causar danos agressivos
ao corpo.
"A hepatite fulminante é uma
condição em que a pessoa não tem problema no fígado, tem fígado saudável, ela
ingere algum remédio, alguma substância que faz com que esse fígado adoeça
gravemente e rapidamente", explicou ela ao UOL.
A doença pode ser causada pelo uso de
diversos medicamentos, como antibióticos ou isotretinoína, utilizado no combate
a acnes. Por isso, Ducatti afirma que é sempre importante fazer o uso destas
substâncias com acompanhamento médico.
"Se há sinal de danos ao fígado, a medicação
é prontamente interrompida", explica ela.
No caso da hepatite fulminante, os
sintomas aparecem quando a lesão já está muito avançada.
"Existe uma hepatite aguda que
acaba evoluindo para a fulminante, em que o fígado fica sem funcionar".
Ainda, segundo a médica, o frasco do
"chá de emagrecimento" tinha várias substâncias hepatotóxicas.
"Sem acompanhamento, o caso evoluiu
para hepatite fulminante. A medicação não tem nada de emagrecedora. É uma falsa
ilusão. Não são todas as pessoas que irão desenvolver a hepatite fulminante,
isso é raro, mas ainda assim é algo grave e evitável. Essa é uma medicação que
não emagrece e pode causar danos", explica ela.
A médica relata que as substâncias em
questão, como o chá verde, não são necessariamente problemáticas em quantidades
pequenas.
"Não estamos falando sobre esse
chá que tomamos de vez em quando por prazer, para relaxar, mas o uso deles em
grandes quantidades, que podem ser tóxicos para o fígado. Como esse remédio era
em cápsulas, a gente nem sabe a real concentração dessas substâncias", relata.
"O problema desses remédios ditos
naturais é que também não tem como saber a real composição, além de ter esse
tanto de erva. Das 50, 10 eram hepatotóxicas."
Para Ducatti o caso de Edmara não é o
primeiro - e nem será o último.
"Não é frequente, mas já tivemos
alguns casos e infelizmente teremos outros. Acaba sendo uma amostra viciada, já
que recebemos pacientes do país inteiro. São casos por esses compostos
emagrecedores, por tomar esses chás em grande quantidade, que dizem ser de
detox... Felizmente, muitos casos são de hepatite aguda e as pessoas conseguem
se recuperar a tempo e o fígado se regenera."
O UOL entrou em contato com a Anvisa
para saber se o medicamento é regularizado no país, mas ainda não obteve
retorno.
A reportagem também tentou localizar a
ProErvas, responsável pela produção do medicamento que é amplamente revendido
online em diversas plataformas, mas não encontrou nenhum representante da
empresa até o momento.
O texto será atualizado quando houver
novas informações.
(Do Uol)
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