Um militar da Marinha aparece em áudios e vídeos enviados em um grupo de mensagens incentivando os atos antidemocráticos em frente aos quartéis das Forças Armadas e afirmando que o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não tomará posse em 1º de janeiro.
Nas mensagens, Ronaldo Ribeiro Travassos
também defende o assassinato de brasileiros eleitores de Lula.
O militar, atualmente, está lotado no
GSI (Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República), chefiado
pelo general Augusto Heleno, um dos aliados mais fiéis de Jair Bolsonaro (PL).
Procurado, ele disse que não comentaria
suas falas e argumentou não saber se era ele mesmo nos áudios.
A Folha
de S.Paulo então encaminhou as conversas ao militar, que não mais
respondeu.
O GSI, por meio de nota, disse que não é
sua competência "autorizar servidores para que participem de qualquer tipo
de manifestação" e que "as
supostas declarações demandadas são de responsabilidade do autor em atividade
pessoal fora do expediente".
O GSI tem como atribuição a segurança do
presidente da República. Atualmente, portanto, de Bolsonaro e a partir de
janeiro passará a trabalhar para Lula.
Em tese, durante a transição, o gabinete
poderia auxiliar fazendo a proteção do presidente eleito em alguns locais, caso
fosse chamado pelo novo governo, e eventualmente atuar na posse.
Mas isso vem sendo rechaçado pela equipe
da Polícia Federal que faz a segurança do petista.
Há um clima de desconfiança no ar.
A PF responsável pela segurança de Lula
excluiu o GSI da sede da transição do governo, no CCBB, em Brasília.
Também tem evitado sua participação na
posse e concentrando a coordenação do evento.
Travassos é primeiro-sargento da Marinha
e trabalha na divisão administrativa do gabinete de Augusto Heleno.
Ele está lotado no Palácio do Planalto
desde o final de 2016, quando Michel Temer (MDB) era presidente.
Em um vídeo gravado no dia 24 de
novembro, data de estreia do Brasil na Copa do Mundo, Travassos critica colegas
do GSI e da Presidência que não estão na manifestação no QG do Exército, em
Brasília, pedindo golpe.
"Aí pessoal, tá lotado. 24 de
novembro de 2022, horário do jogo do Brasil, mas o povo não quer nem saber, o
povo está aqui lutando pelo Brasil. Eu tenho certeza que o ladrão não sobe a rampa.
Agora, você que tá bonitinho em casa, quando seu filho virar boiola ou uma
sapatão esquerdista, não reclame", diz ele.
Sobre a hipótese de o presidente eleito
Lula não tomar posse, o militar diz em um áudio ter feito a previsão a outro
integrante do GSI, o general Joaquim Brandão, que é assessor especial de
Heleno.
"O general Brandão me perguntou lá
no gabinete: Marujo, o que você acha? Acho não, tenho certeza, o ladrão [em
alusão a Lula] não vai subir a rampa. Por que você diz isso? Porque eu confio
no povo que tá lá no QG, em todos quartéis Brasil afora, confio nos
caminhoneiros e nos índios. Se as Forças Armadas não fizerem nada, nós vamos
fazer."
Nas redes sociais, há registros do
militar nos atos do feriado de 7 de Setembro, capturados eleitoralmente pelo
chefe do Executivo.
Na manifestação no QG do Exército,
fotos, áudios e vídeos compartilhados em um grupo mostram que Travassos chegou
a dormir ao menos uma noite no local junto aos manifestantes.
Além das falas golpistas, o militar diz
nas conversas as quais a Folha teve acesso que haverá uma "guerra
civil" no país.
"Estevão, apagou por quê? É isso
mesmo, tem um monte de colega omisso. Tem gente aqui nesse grupo, tem grupo de
fora, meu prédio tem 17 moradores, dos 17, seis fazem o L. Nós precisamos saber
quem é quem, porque a guerra civil vai rolar", afirma Travassos.
A mensagem enviada ao grupo era uma
resposta a Estevão Luiz Soares, outro militar da Marinha lotado na Presidência.
Após a citação à suposta guerra civil,
Travassos afirma que defenderia qualquer patriota, como os apoiadores de
Bolsonaro se auto intitulam, mas daria um tiro na cabeça do próprio irmão se
ele fizesse o L gesto característico dos eleitores de Lula.
"Não tô falando isso de
brincadeirinha, não, é sério. Quem faz o L é terrorista. Tem que morrer mesmo,
ou mudar ou morrer, porque não tem jeito uma pessoa dessa", diz
ele.
Travassos é militar da ativa e,
portanto, não poderia participar de manifestações político-partidárias.
A Constituição proíbe a filiação de
militares da ativa a partidos políticos e a norma que rege a categoria diz que
é proibida "quaisquer manifestações
coletivas, tanto sobre atos de superiores quanto as de caráter reivindicatório
ou político".
A proibição é tratada pelo próprio
Travassos em um dos áudios. Em resposta a um outro integrante do grupo, ele
afirma que, embora 80 pessoas integrem o grupo, apenas cerca de 15 foram para a
manifestação no QG do Exército em Brasília.
Na fala, porém, ele afirma que "o
general" tem conhecimento da sua participação nos atos antidemocráticos,
sem citar se o general seria Augusto Heleno, chefe do GSI.
"Pelo amor de Deus, alguém tá preocupado
com isso? Ah, não vou não porque sou militar e não posso. O general sabe que eu
tô aqui e eu falei que tem bastante gente, tem gente da segurança e tudo. Oh,
meu irmão, é tudo ou nada, não tem conversinha."
(Folha de São Paulo)
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