Dias antes de ser nomeado comandante do Exército pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o general Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva fez uma palestra no Comando Militar do Sudeste em que afirmou que uma tentativa de golpe resultaria em "sangue na rua" e transformaria o Brasil em um pária internacional.
No mesmo discurso, ele acusou o
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de tentar instrumentalizar o Exército, negou
a tese de fraude nas urnas eletrônicas e chamou os eventos do dia 8 de janeiro
de "coisa infantil, besta, burra e irascível".
A tônica da fala de Paiva foi uma
crítica à politização das Forças Armadas, reforçando o caráter de instituição
de Estado, não de governo.
O general afirmou ser preciso combater
os "extremos dos dois lados" e chamou os manifestantes que
invadiram as sedes dos três Poderes de "malucos" e "vândalos".
"É um cara que entrou numa espiral
de fanatismo que não se sustenta. O que produziu? Ia derrubar o governo assim?
O Supremo muda? Todo mundo se comunica e julga por sistema online. Se jogar uma
bomba no palácio, ele vai despachar de outro. Que coisa infantil, besta, burra,
irascível".
As declarações foram feitas no dia 18 de
janeiro, em uma cerimônia em homenagem aos militares mortos no terremoto de
2010 no Haiti, e reveladas pelo podcast Roteirices.
Antes de iniciar sua fala, Paiva
advertiu que não queria ser gravado: "Eu me recuso a ter que pedir para o pessoal
para deixar o celular fora, porque eu tenho plena confiança naqueles que são
meus comandantes de unidade. Então eu peço que ninguém grave nada",
afirmou.
Paiva também comentou mensagens que
militares passaram a receber nas redes sociais após a vitória de Lula, pedindo
que as Forças Armadas tivessem "coragem" para evitar que o presidente
eleito tomasse posse.
"Intervenção militar com Bolsonaro
presidente. Impossível de fazer. Imagina se a gente tivesse embarcado em uma
aventura. Vocês viram a repercussão mundial. A gente não sobreviveria como
país. A moeda explodiria, a gente ia levar um bloqueio econômico jamais visto.
Você ia ficar pária, e o povo ia sofrer as consequências. Ia ter sangue na rua
(...) Coragem é o reverso. Coragem é se manter instituição de Estado, mesmo que
custe alguma coisa de credibilidade e popularidade", afirmou o
general.
O general defendeu o então comandante do
Exército, Júlio César Arruda, a quem ele substituiria dias depois, e afirmou
que faltou ordem de Lula para esvaziar os acampamentos bolsonaristas antes do
dia 8 de janeiro.
"De 1º de janeiro até o dia 8,
quem era o governo? E qual a ordem recebida para retirar (os manifestantes)?
Nenhuma. Não teve ordem. Porque a expectativa era que o movimento ia
naturalmente dissolver", disse.
"O general Arruda fez o certo. Eu
faria a mesma coisa. Impediu que entrassem no acampamento para prender as
pessoas à noite. Ia rolar sangue. Tudo o que ocorreu no dia 8 em Brasília está
sendo apurado via inquérito. 'Ah general, tinha cara nosso'. Todo o mundo viu
as imagens. O coronel (Adriano) Testoni, todo mundo viu imagem do general da
reserva. Se ele fez coisa errada, vai ser responsabilizado e faz parte do
processo de apuração normal", disse.
Como mostrou o Estadão, o coronel
Testoni participou da marcha na Esplanada dos Ministérios no dia 8 de janeiro e
divulgou dois vídeos em suas redes sociais ofendendo o Exército e xingando generais
do Alto Comando.
Foi aberto um Inquérito Policial-Militar
(IPM) para apurar fatos relacionados ao ataque às sedes dos três Poderes e o
coronel da reserva Adriano Camargo Testoni foi indiciado por injúria contra os
integrantes do Alto Comando da Força Terrestre e por ofensa contra as Forças
Armadas, ambos crimes previstos no Código Penal Militar.
Pelos crimes em suas formas agravadas, o
oficial pode pegar até 2 anos de prisão.
O ministro Alexandre de Moraes, do
Supremo Tribunal Federal (STF), abriu nesta segunda-feira (27) uma investigação
sobre a participação de policiais militares e membros das Forças Armadas nos
atos golpistas do dia 8 de janeiro.
A decisão põe fim ao debate sobre quem
teria a atribuição para processar e julgar os militares envolvidos nos
protestos extremistas na Praça dos Três Poderes: a Justiça Militar ou a Justiça
comum.
Relator das investigações sobre o 8 de janeiro, Moraes definiu que a
competência é do STF.
'EXÉRCITO
NÃO TEM PARTIDO'
Na gravação do dia 18 de janeiro, Paiva afirmou,
ainda, que o "pessoal da extrema direita" estava corroendo as Forças
Armadas, inclusive dentro da própria instituição.
"O pessoal da extrema direita, que
incluo pessoal nosso, está permitindo que nos ataquem, inclusive tentando
destruir cadeia de comando".
Paiva também defendeu que o Exército não
pode sucumbir a posicionamentos político-partidários.
"O Exército não tem partido. Isso
tem de ser um mantra. Se a gente permitir que o Exército fique partidário, é o
começo da nossa derrocada. Quem permite que a instituição vire partidária é a
Polícia Militar, e ela sofre as consequências disso", disse.
(Terra)
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