*Abusada pelo padrasto e renegada pela
mãe, Anna Teles foi morar na rua aos 15 anos, mas conseguiu mudar sua vida por
completo
No turbilhão das ruas do Pelourinho, em
Salvador, onde o som dos tambores e a alegria do samba se misturam com o cheiro
de dendê, nasceu uma história de resiliência e transformação protagonizada por
Anna Telles.
A baiana de 34 anos, uma mulher negra
outrora invisível para a sociedade, decidiu reescrever seu destino e se
aventurar no empreendedorismo.
Foi assim que ela superou a pobreza, se
tornou milionária e construiu seu próprio império no ramo da beleza.
Ainda aos 12 anos, Anna começou sua
jornada no mundo da estética ajudando uma vizinha a fazer tranças.
“Aprendi a fazer tranças com a vizinha porque
minha mãe usava química no meu cabelo, e isso me causava muitos problemas. A
partir daí, comecei a ajudar a vizinha como uma troca de favores: eu a ajudava
e ela arrumava meu cabelo sem custos. Foi assim que comecei a desenvolver
minhas habilidades”, conta ela.
Pouco tempo depois, essa habilidade se
tornou sua principal fonte de renda.
Mas a vida de Anna não foi fácil.
Aos 15 anos ela foi obrigada a sair de
casa após ser abusada sexualmente pelo padrasto.
A mãe, quando soube, deu-lhe um tapa no
rosto e ficou do lado do companheiro, relembra ela.
A única solução para a baiana foi
abandonar a própria casa e as ruas do Pelourinho se tornaram seu “lar”.
Sobrevivência
nas ruas...
Anna já havia conquistado a habilidade
de fazer tranças.
Nas ruas, também aprendeu a vender.
“Tudo que eu queria era não me envolver com
drogas e prostituição”, relata a empresária.
Nas ruas, ela oferecia seu serviço de
trancista.
Fazia serviço a domicílio e, como o
trabalho demorava, ela conseguia almoçar e às vezes até dormir na casa de
clientes.
“Eu continuei fazendo tranças em troca de uma
roupa, um trocado ou alguma coisa para minha sobrevivência”, conta.
Em
meio ao caos, amor...
Durante esse período morando na rua e
fazendo “bico” de trancista, Anna conheceu seu verdadeiro amor, que, mais
tarde, se tornaria um grande incentivador.
“Quando conheci meu esposo, ele me mostrou
que as tranças que eu fazia eram um negócio. A partir daí, comecei a ensinar as
meninas da minha comunidade, que, assim como eu, não tinham oportunidades.
Comecei a divulgar no Facebook e várias pessoas de todo o Brasil começaram a
aparecer”, relembra Anna.
Primeira
queda...
Com o alcance de seu empreendimento, um
homem apareceu propondo criar uma empresa, da qual ele, Anna e o marido seriam
sócios.
Sem conhecimentos na área técnica do
empreendedorismo e possuindo apenas a educação básica, a baiana achou que abrir
uma empresa com um homem que, apesar de desconhecido, parecia profissional,
seria uma boa ideia.
“No início, fiz uma sociedade com um homem
branco. Eu pensava: já que ele estudou, vai fazer meu negócio ser melhor. Fiz
isso porque acreditei que o conhecimento dele era suficiente. Eu estudei até a
8ª série, então eu achava que o que eu fazia não era suficiente”.
No fim, o casal teve um prejuízo de mais
de “40 mil reais”.
Após o término da sociedade e um grande prejuízo
financeiro, Anna e seu marido decidiram seguir sozinhos.
Ascenção...
Com muita luta, o casal quitou as
dívidas e decidiu investir, também, em produtos para cabelos crespos e
cacheados.
“Eu via que no mercado não tinha produto para
o meu tipo de cabelo. Eu tinha que fazer várias misturas caseiras para
conseguir dar um resultado. Foi a partir daí que vi a necessidade das minhas
clientes terem um produto para cuidar dos seus cabelos”, conta.
Com um empréstimo pessoal de “10 mil
reais”, Anna iniciou sua linha de produtos.
“Tive dificuldade financeira. Mesmo com o
nome limpo, os bancos não me davam crédito. Para ter a minha linha de cabelos,
eu e meu esposo tivemos que fazer um empréstimo pessoal. Vivi preconceito de
diversas formas. Por mais que eu tivesse dinheiro para comprar, sempre tinha
algo ‘invisível’ que me impedia de fazer as coisas”, diz Anna sobre o
racismo que sofreu durante o processo.
A internet foi o meio escolhido para
divulgar seus produtos e alcançar novos consumidores.
O negócio cresceu rapidamente, e logo
Anna conseguiu abrir sua primeira loja física.
Oportunidade
na pandemia...
Durante a pandemia, ela tomou uma
decisão estratégica que se mostrou crucial: migrar da loja física para o
comércio on-line.
“Na época, o que fez muita diferença foi
migrar a loja física para o on-line. Eu tinha uma loja no shopping, nos
desfizemos dela e transformamos no e-commerce. Deixamos de vender somente para
nossa cidade e passamos a vender para todo o Brasil.”
Essa mudança, juntamente com o uso do
marketing de influência e a venda em atacado, impulsionou o crescimento da
marca.
Em 2022, Anna faturou R$ 3,5 milhões.
No ano seguinte, o faturamento foi de R$
4.827.183,81 e, até a metade de 2024, a empresa já havia arrecadado R$
2.538.842,06.
Planos
futuros...
Ambiciosa, Anna pretende expandir ainda
mais sua marca.
“Penso na minha aposentadoria daqui a cinco
anos. Para a minha empresa, temos uma meta de que nesse prazo, queremos
alcançar 149 milhões de pessoas crespas e cacheadas no Brasil e no mundo”,
diz Anna sobre o sonho de alcançar cada vez mais clientes.
Hoje, a marca de cosméticos já chegou
aos Estados Unidos e Europa e está entre as 15 maiores do Brasil.
Anna já atendeu mais de 10 mil mulheres
e tem um objetivo claro para o futuro: “Quero alcançar o top 1”, diz,
empolgada.
“Quero ser inspiração para muitas mulheres
negras. Mostrar que, mesmo diante das maiores adversidades, é possível
transformar a própria vida e alcançar o sucesso. Eu tomei a decisão de
empreender e me tornei a primeira milionária da família. Espero não ser a única,”
conclui Anna.
(Giovanna Estrela – Metrópoles)
*Imagens/fotos cedidas ao Metrópoles)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.